O clima é de apreensão mesmo em setores voltados para commodities — cuja exportação, em tese, pode ser redirecionada com mais facilidade. No Vale do São Francisco, principal polo exportador de mangas do país, os produtores se preparam para a colheita entre agosto e outubro, período em que quase toda a safra é destinada aos Estados Unidos. Com a tarifa de 50%, os embarques para lá se tornariam inviáveis, e a alternativa seria desviar os produtos para a Europa, o que criaria um excesso de oferta e derrubaria os preços no mercado europeu. Em qualquer cenário, os prejuízos serão inevitáveis. “Veremos uma forte redução de preços nos Estados Unidos para salvar parte da produção”, diz Nelson Costa Filho, presidente da Ibacem, maior exportadora brasileira de mangas para o país. “Mesmo assim, o volume embarcado será mínimo.”

APOIO — Tarcísio de Freitas: São Paulo terá linha de crédito para exportadores
Empreendedores e entidades setoriais admitem que têm orientado seus parceiros comerciais nos Estados Unidos a relatar ao governo americano os potenciais prejuízos que o tarifaço causará ao comércio bilateral. A estratégia busca sensibilizar Washington a partir da perspectiva das próprias empresas americanas, que também seriam afetadas pela medida. Um exemplo é a Kraft Heinz, gigante global de alimentos, que contratou o poderoso escritório de advocacia WilmerHale para pleitear junto à Casa Branca um regime de exceção ao café brasileiro, utilizado no processamento de produtos vendidos sob as marcas Maxwell House e Gevalia.

IMPACTO — Frigorífico da Minerva: setor será um dos mais atingidos pela medida
Se o empresariado nacional mantém ceticismo quanto à capacidade do governo de reverter o tarifaço, ao menos espera medidas concretas para reduzir seus efeitos. Coube ao vice-presidente Geraldo Alckmin a tarefa de liderar as negociações com os americanos enquanto articula, junto ao setor produtivo, formas de apoio emergencial. Empresários que participaram das reuniões com Alckmin compararam a gravidade do momento à crise provocada pela pandemia de covid-19 em 2020 e sugeriram um pacote semelhante ao adotado na época, com suspensão de tributos, crédito facilitado e medidas de desoneração.

LIMITE — Laranjal na Flórida: produção local é incapaz de suprir a demanda do mercado americano
Diante da relevância das exportações para os Estados Unidos em economias regionais, alguns governadores também já preparam programas estaduais de socorro às empresas mais atingidas. Em São Paulo, o governador Tarcísio de Freitas anunciou uma linha de crédito de 200 milhões de reais voltada aos exportadores. No Espírito Santo, Renato Casagrande criou um comitê emergencial para elaborar um plano. “Apoiaremos os exportadores da maneira que for possível”, disse Casagrande a VEJA. “Não podemos esperar, porque há o risco real de não haver negociação diplomática entre o Brasil e os americanos.” Além disso, o Senado brasileiro estuda enviar uma comitiva oficial a Washington na próxima semana. Parlamentares da Comissão de Relações Exteriores planejam reuniões com seus pares nos Estados Unidos para “plantar a semente do diálogo”.

DESAFIO — Usina da ArcelorMittal: siderúrgicas buscarão mercados alternativos
Na quarta 23, em discurso na Organização Mundial do Comércio (OMC), o governo brasileiro criticou as tarifas, sendo apoiado por representantes de outros quarenta países. O efeito disso é nulo, pois Trump passou a ignorar a entidade. No ambiente doméstico, ele se encontra pressionado diante do surgimento de novas provas de suas relações com Jeffrey Epstein, o magnata responsável por uma rede de exploração sexual de menores que se suicidou na cadeia em 2019. No campo externo, o republicano tem levado vantagem com a tática de ameaçar com uma retaliação alta para depois chegar a um acordo mais vantajoso. Na terça 22, ele anunciou a redução de 25% para 15% da tarifa aplicada sobre produtos japoneses. Em contrapartida, o país asiático ampliará os investimentos nos Estados Unidos e aumentará as importações de bens americanos. Negociar com o republicano não é difícil apenas para o Brasil, mas é possível, como mostra o exemplo. O caminho passa por deixar de lado as bravatas e investir no pragmatismo diplomático. Ainda há tempo de evitar o pior.
Publicado em VEJA de 25 de julho de 2025, edição nº 2954